sexta-feira, 11 de julho de 2008

amor

Papai tem o ar severo e os olhos frios como os corpos que tem de abrir todos os dias. A boca diminuída pela falta de uso: geralmente, só o vejo articulando palavras quando me manda ir para o quarto.

Mas tenho um segredo: Papai me ama.
Papai me ama em excesso.

Sempre que fala comigo, suas palavras são ásperas.
Quase nunca me olha nos olhos. E quando olha, seu olhar passa por mim como se eu não existisse.
Não sei o porquê de tanto cuidado. Não entendo pra quê tanto amor.
Esse amor doentio.
Isso tudo porque papai me ama demais.

Papai nunca me responde quando pergunto algo.
Fala com as paredes, mas não comigo.
Ele quer me poupar.

Seu ciúme é tão doentio quanto seu amor.
Ele me ama. Ele me ignora. Ele me intimida.
O ciúme de papai é tão grande que chega ao ponto de ele fingir que não se importa comigo.

Eu sei que ele me ama.

Papai admira as mulheres. Mas ama a mim.
Tenho pena delas... Papai gosta delas, mas a ama a mim. Papai tem a elas, mas ama a mim.

Papai tem um amor tão grande por mim que não cabe em seu coração.
Por isso finge. Por isso mente.
Guardar tanto amor o está enlouquecendo.
Por isso finge. Por isso mente.

Vivo querendo chamar a atenção de papai.
Pelas minhas ações ele deve desconfiar... Desconfiar de que não ligo para ele.

Eu não o amo, papai. Você sabia?